A Negritude
Em 1981 visitamos o gabinete do deputado Carlos dos Santos-MDB em Brasília, quando digo nós éramos eu Manoel Messias Pereira, João aparecido da Cruz e José Afonso Imbá (falecido). E recebemos do deputado um pequeno livreto na qual havia um texto intitulado "Negritude", e constava o seguinte "No que se refere ao princípio da dignidade da pessoa humana e defesa impostergável de seus direitos, quando o plenário estremece e os microfones retumbam na vibração dos que defendem a essência, tem-se a impressora desoladora de que se trata de um bem de propriedade restrita algo marcado pela exclusividade de um grupo, os massacrados no fundo do cárceres, os vilipendiados pelas torturas físicas e morais dos "leões de chácara" do regime, os que pagam na crueza dos suplícios mais desumanos, o crime de pensar e discordar.
Sobre eles se desdobra sempre um adamascado dossel de fascínio popular, todo tecido do solidarismo humano, de aplausos e ressonâncias política, votos, manchetes e prestigio carismático, auréola, enfim, de santo leigos de todas as liberdades populares.
Desgraçadamente, diferente é a sorte, porém, de um outro grupo tão numeroso, ou mais ainda, tão sofrido e tão massacrado, pelos aguilhões das afrontas que, se não ferem a carne, rasgam -lhe os últimos resquícios de dignidade humana. A sua tragédia pouco ou nada repercute aqui dentro, pois de tão comum na subjetividade de seus contornos, parece até ter-se amoldado ao conluio das normalidades sociais. E a turba dos "palmarinos" "patrícios", que a estupidez atávica do racismo a cada instante escarra -lhe impunemente na cara ebanizada, sem recolher o anátema de brasilidade desta Casa, a não ser na timbragem de franciscana pobreza de uma voz negra, que de tanto e quase isoladamente abordar o problema sempre que lá fora ocorre um caso de racismo - brandando pelo espirito de unidade pátria, perigosamente ameaçado pela força separatista do preconceito de cor entre brasileiros: bem poderá resultar ser acoimado de "racista".
Nesta época em 1981 a Câmara de Deputado só tinha duas pessoas negras o Sr. Carlos dos Santos-MDB-RS e o Sr. Alceu Colares-PDT-RS. Neste di também visitamos a sala de Alceu Colares e derrubamos a garrafa de café sobre a mesa. Uma cena bem confusa, rimos depois.
Esse texto veio -me na lembrança neste Festival Abrasasas-Cinema, na qual participei de uma discussão tendo ao meu lado Darok presidente do Conselho Afro de São José do Rio Preto-SP, e o cineasta Ari Candido Fernandes e que teve o Sr. Reinaldo Volpato, como mediador. E a conversa foi imensamente de bons proveitos uma vez que cada um de nós expomos as nossas opiniões que permaneceram com um registro histórico e talvez uma obra, em que o debate evoluiu.
E houve um momento em que o cineasta Reinaldo trouxe a questão da formação da chamada nação brasileira. E a questão foi trazida com base no trabalho universitário do professor Romildo Sant'Anna. E recordo que diz no Brasil não existe a ideia de nação somos na verdade uma diversidade. E sei que a primeira vez que tentaram fazer isto na historiografia segundo Jayme Pinsky, foi quando usa-se a ideia da expulsão dos holandeses na história do Brasil, é quando um historiador resolveu dizer que Henrique Dias, António Dias Cardoso e Felipe Camarão foram os três representantes das tres raças que lutaram para expulsar os holandeses. E ele afirmou isto foi uma mentira que resolveram escrever num livro e noutro anos vários autores copiaram. E essa mentira foi para dar sentido de nação a nossa história. E vi essa revelação numa Conferencia de Educação feita no SENAC de Águas de São Pedro-SP.
Porém quando lemos o trabalho organizado de Arno Vogel, de 2001, intitulado "Trabalhando com a Diversidade no Planfor: raça/cor, gênero e pessoas portadoras de necessidades especiais na página 24 encontramos o seguinte texto "Efeitos da Fábula das três raças". E consta o seguinte texto "Por alguma razão, Casa Grande e Senzala é das poucas obras acadêmicas que repercutiram estrondosamente dentro e fora dos círculos acadêmicos impondo seus conceitos à vida nacional de forma avassalador. Depois questionada por acadêmicos, a impugnação permaneceu no âmbito da academia. A influência do livro é tamanha que ainda hoje é comum que até mesmo quem não tenha lido cite como argumento definitivo." E A Fabula das três raças continua a ser contada pelo sistema de ensino, quase sempre acriticamente e de forma igualmente ufanista e assim continua a ser repassada pela literatura e pelos meios de comunicação em geral."
Pois bem esses fragmentos possibilita, entender que na obra Casa Grande e Senzala temos o olhar da Casa Grande para a Senzala. em que a violência contra o ser humano negro simplesmente é cristalizada como verdades. E o preconceito , a discriminação e o próprio racismo é parte do sistema. Acabar com isto deve ser uma tarefa para derrubar o sistema. E o que estou dizendo é a luta contra o sistema capitalista, politico, econômico e social.
O sistema em que estamos vivendo é o sistema que permite o crescimento do processo de desigualdade, de diferenciação social, de um cratera cada vez mais violento. E isto traz o processo de agressões como algo natural. Isto não é uma naçao é sim um território em que se convive com a diversidade e essa precisa ser alicerçada no respeito coletivo, e numa paz bendita do contrário estaremos fomentando essa discórdia naturalizada.
E quando temos as palavras de Carlos dos Santos, já na sua idade, no parlamento ainda em pleno período ditatorial Civil, Militar e empresarial que se abateu sobre o país em que o Brasil submeteu as operações Bhroter Sam, Condor e Bandeirantes satisfazendo os anseios de Washington, e censurando imprensa, assassinado grupos de visões socializantes e humanistas.
E por isto as palavras de Carlos dos Santos-MDB, eram tão intensamente dramáticas que estremeciam o plenário e os microfones retumbam na essência dos que defendem um processo de humanismo de respeito coletivo, e que não permitem que todas as desgraças arrebentem sobre as cabeças dos povos negros.
E neste momento incorporo as palavras sensatas do cineasta Ari Candido quando ele pede para não permita rotular o negro de forma nenhuma e pede para que todos nós não diluirmos, ou seja juntos somos mais forte. Mas se permitir não deixem que pela negritude pela cor você ser humano afro descendente seja usado como massa de manobra. Ou enfim se há um movimento fascista/nazista afaste-se dele. E não seja usado pelo capital. Tenha uma dignidade como a principal causa humanista.
Pois o Brasil tem um histórico de mais de 500 anos de capitalismo e exploração e de diversas formas de escravidão com violência. E fora da escravidão com desprezo ao povo afro-brasileiro, coma utilização do preconceito, da discriminação, com a intolerância religiosa, e com todas outras formas correlatas de sub julgar o ser humano. E é tempo de refletir sobre isto é entender esse recado. Sejamos todos anti -capitalista, anti fascista e se possível devemos entender a vida por um Poder Popular em que todos possam ser protagonistas do destino do País e não apenas uma classe social privilegiada.
Manoel Messias Pereira
professor, cronista e poeta
Membro do Coletivo negro Minervino de Oliveira - São José do Rio Preto- SP
Membro da Academia de Letras do Brasil -ALB São José do Rio Preto- SP. - Brasil
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