Correspondências
Sou de um tempo em que trocar cartas era um hobby, para manter ativamente uma grande amizade, um grande respeito um grande tema. E assim trocamos palavras , informações ideias e as nossas comunicações eram algo admirável tanto dentro do país quanto fora dele. No Brasil havia informações que cruzava o sul, o leste, o oeste, o centro oeste o norte e o nordeste. Fora do Brasil correspondia com Uruguai, Paraguai, Argentina e os Estados Unidos. No Rio de Janeiro tinha correspondentes que eram agencias internacionais, que trazia-me informações de Angola e de parte da África Ocidental. Porém essas informações e amizade era algo muito tranquila para fazer. E um dia lendo o jornal a Folha de São Paulo vi uma informação que falava de Dr. Paulo Elpídio de Meneses Neto um professor da Universidade Federal do Ceará. Que estaria realizando uma semana dedicada ao Nordeste. Como neto de nordestino cumprimentei e assim começamos uma longa amizade, por correspondência.
E antes de aposentar-se li muita coisa que Dr. Paulo Elpídio enviou-me inclusive muitos livros que ajudaram-me na compreensão organizacional sobre educação e o pensamento universitário do Brasil e do mundo. Recordo aqui um texto do seu livro "Universidade ação e reflexão", em que ele escreveu com o seguinte título "Velhos Equívocos" e que consta de que "Ninguém será dado desconhecer o quadro dramático em que se debate a Educação Básica no Brasil. Qualquer observador atento ao sistema educacional brasileiro e das necessidades que produzem em nível de escolarização reconhecerá o papel da Educação de 1. e 2. graus." Isto significa dizer do Ensino Fundamental e Ensino Médio hoje. "Daí atribui -se à limitação de recursos orçamentários a responsabilidade exclusiva pelos índices atuais de evasão e repetência vai uma longa distância."
E continua a sua reflexão dizendo também dos "baixos índices de escolaridade e da repetência, velho fantasmas com os quais nos habituamos a conviver, embora agravados pelos seus precários padrões de desempenhos. Retrato sem retoque de um quadro de evasão de abandono da escola. Condições sociais de fácil identificação, graças às quais a frequência aos bancos escolares transforma-se em um ônus insuportáveis para certo estratos da sociedade." E este simples fragmentos me fez entrar em sala de aula ainda entendendo que erámos parte considerável de uma solução se não a curto prazo pelo menos dando um indicativo, para a futura geração de educadores.
Pois somente eu sei o que é estar na escola com agua no estomago e esperando uma sopa quente para satisfazer a fome. Somente eu sei que antes de ser professor eu fui aluno e carente daquilo que chamávamos o aluno "da caixa" na qual a escola fornecia um caderno um lápis e dizia vá enfrente.
A escola pública é onde a desigualdades se encontra, é onde as relações humanas se tocam mais interativamente é onde se constroem todos os sonhos, e se desmancham outros sonhos. Quantas vezes temos um amigo que vai para a escola e põe toda a sua rebeldia, como sua auto defesa. E sozinho as vezes segue em solidão. Muitas vezes não tem a mãe em casa, outras vezes só tem o pai, que sai cedo e deixa apenas uma marmitinha com arroz um tomate ou um ovo frito sobre o fogão. E essa experiência entre dois amiguinhos pobre quantas vezes fomos parceiros juntos. Eu e meu amiguinho o Zé Capeta, que todo mundo queria vê-lo como inimigo só que erámos o maior amigo.
Ele dizia vamos almoçar juntos e lá íamos nós sentávamos na mesinha e ele trazia a panelinha de arroz com o ovo frito e partilhávamos e eu dizia qualquer dia vamos lá em casa. Mas ele dizia não posso tenho que deixar a casa limpa para quando o meu irmão e meu pai vier tudo esteja bem. Na escola era o rebelde que gostava da musica do Roberto Carlos evidente era para encantar as meninas e ser ríspidos com os outros garotos e botar ordem no espaço que nos cabiam. Erámos os mais humildes daquela escola. A minha contribuição era apenas iluminar outros garotos com a minha força de estudar e demonstrar que a escola era o meu melhor. Já sofri injustiça evidente, já sofri racismo claro, já fui discriminado muito. Já briguei evidente. Já apanhei nunca.
A vida de garoto precisa ser sempre de estratégia de sobrevivência. E junte-se aos seus iguais com o propósito de auto defender-se. Já vi outros meninos apanhar no ensino fundamental evidente dos colegas e até das professoras. Só que o respeito com professores funcionários precisa ser algo que possa ser trabalhado pela busca de um sentido só a luta é qualidade de ensino é o estabelecer a coerência e a filosofia da escola. Porém um dia conversei com Paulo Freire quando ele veio na minha cidade, que me disse pessoalmente que pra cobrar coerência é preciso o exercício da incoerência, para que saibamos essa diferença, entre uma e outra. E quanto a filosofia da escola penso que passa pelo os sete saberes necessários à educação do futuro de Edgar Morin, que numa síntese do professor Carlos R. Paiva ele afirma sobre a "Cegueira do conhecimento: Erro e ilusão onde consta "A educação que visa a transmitir conhecimento é cega quanto ao que é o conhecimento humano, seus dispositivos, suas enfermidades, dificuldades, tendências ao erro e a ilusão, e não se preocupa conhecer o que é conhecer."
E nos brinda dizendo que o conhecimento não é uma ferramenta ready made, utilizada sem que a natureza seja examinada. Ou seja o conhecimento do conhecimento deve ser uma necessidade primeira, uma preparação para enfrentar os riscos permanentes de erros e ilusão que não cessa de parasitar a mente humana. é preciso armar a mente no combate vital à lucidez.
Evidente que o investimento em educação conta, pois os objetivos da escola passa por ai, para gerar consequências duradoura e pré condições econômicas e sociais sem as quais não vencerá as frustrações de uma ação medíocre, contidas por suas próprias limitações. Em outras palavras a magnitude dos investimentos em capital humano em mão de obra está condicionado as mudanças que precisamos operar na sociedade no sistema politico. Somente assim saberemos se teremos impulsos animadores ou inibidores da ação educativa.
Enfim neste sistema de desigualdade de criação de preconceitos, de racismos, de homofobias, e de xenofobias de violências ninguém vai fazer voos altos da educação, mas com certeza enterraremos ela muito mais do que ja estamos cavando cova. e para entender isto separa o sujeito e o objeto, determina uma dupla visão de mundo, sujeito e objeto, alma e corpo, espirito e matéria qualidade e quantidade, finalidade e causalidade, sentimento e razão. E depois faça o exercício de coerência e de incoerência como me ensinou Paulo Freire. E com isto reflita sobre o trabalho na escola e fora dela. E seja feliz passe bem.
Essas velhas cartas me ensinaram a refletir sobre a miséria e as dificuldades, como sol segue esturricando as terras secas e sem água. Ou seja iluminando-as.
Manoel Messias Pereira
professor, cronista e poeta
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